domingo, 7 de junho de 2009

INFINITA VIAGEM - ARCA



Apelo feito à comunidade escolar:

Nesta arca deixou Fernando Pessoa grande parte da sua obra.
Nos 120 anos do seu nascimento queremos continuar a celebrá-lo, LENDO-O para toda a comunidade escolar.

Se tem algum texto pessoano preferido, deixe-o na nossa arca.

(identifique-se com nome e turma, p.f.)


Alguns textos que apareceram na "nossa arca pessoana":

Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,
Não há nada mais simples.
Tem só duas datas – a da minha nascença e a da minha morte.
Entre uma e outra cousa todos os dias são meus.

Sou fácil de definir.
Vi como um danado.
Amei as coisas sem sentimentalidade nenhuma.
Nunca tive um desejo que não pudesse realizar, porque nunca ceguei.
Mesmo ouvir nunca foi para mim senão um acompanhamento de ver.
Compreendi que as coisas são reais e todas diferentes umas das outras;
Compreendi isto com os olhos, nunca com o pensamento.
Compreender isto com o pensamento seria achá-las todas iguais.

Um dia deu-me o sono como a qualquer criança.
Fechei os olhos e dormi.
Além disso, fui o único poeta da Natureza.


Alberto Caeiro

Quando era criança
Vivi, sem saber,
Só para hoje ter
Aquela lembrança.

E hoje que sinto
Aquilo que fui.
Minha vida flui,
Feita do que minto.

Mas nesta prisão,
Livro único, leio
O sorriso alheio

De quem fui então.

F. Pessoa

Segue o teu destino.
Rega as tuas plantas.
Ama as tuas rosas.
O resto é sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.

Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos Deuses.

Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.


Ricardo Reis

E este livro é um gemido. Escrito ele já o Só não é o livro mais triste que há em Portugal.
Ao pé da minha dor todas as outras dores me parecem falsas ou mínimas. São dores de gente feliz ou dores de gente que vive e se queixa. As minhas são de quem se encontra encarcerado da vida, à parte…
Entre mim e a vida…
De modo que tudo o que angustia vejo. E tudo o que alegra não sinto. E reparei que o mal mais se vê que se sente, e a alegria mais se sente do que se vê. Porque não pensando, não vendo, certo contentamento adquire-se, como o dos místicos e dos boémios e dos canalhas. Mas todo o mal entra em casa pela janela da observação e pela porta do pensamento.


Bernardo Soares


Lisbon Revisited (1923)

Não: não quero nada.
Já disse que não quero nada.

Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.


Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
(…)
Que mal fiz eu aos deuses todos?

Se têm a verdade, guardem-na!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Não me macem, por amor de Deus!
Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?

Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?

Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja de companhia! (...)

Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...

E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!


Álvaro de Campos

... e manuscritos de Pessoa lá colocámos...







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